Estava um tanto desnorteada, mas não sabia ao certo o motivo daquela inquietação. O dia foi passando, e eu não compreendia. Parei, vendo televisão. Sabe quando a gente fica sapeando pelos canais, sem assistir nada exatamente? Mas foi exatamente ali, parada, sem nada para fazer, que eu percebi o que me inquietava. Eram as coisas que não foram ditas, que ficaram por dizer. E assim, acabei aqui, mais uma vez debruçada sobre pilhas de papéis, escrevendo cartas que nunca envio e que ninguém, além de mim, lê.
Entenda, só estou te explicando todas essas coisas por que não quero que pense que não tenho nada para fazer ou ainda que estou buscando uma reconciliação contigo. Não é nada disso. É só uma angústia enorme que eu sinto com coisas inacabadas. E nisso você tem que concordar comigo, nossa história ficou inacabada.
Por falta de palavras ditas, por meias-palavras proferidas, sei lá. Mas acontece que nós não tivemos um final adequado. E é o que me dói mais. Talvez porque quando as coisas não terminam realmente, ainda fique aquele restinho de sentimento, sabe como né? Fiquei imaginando como seria se um dia nós nos esbarrassemos na rua. Fica aquele constrangimento sem graça. Eu te pergunto sobre sua mãe e seu trabalho. Você me diz que tudo está bem, e me pergunta se estou gostando da faculdade. E nos despedimos. E é a parte mais engraçada. Os dois confusos, sem saber como nos despedir. Eu avanço para te dar um beijo, e você, com aquele seu jeito grosso, me afasta, e aperta minha mão. Tudo tão normal que soa estranho. Porque aquilo tudo não aconteceria normalmente, não entre nós dois. E quando eu me afasto, tenho vontade de chorar. E choro. Por toda aquela cumplicidade que se foi, e já não é mais.
Ou então, imagina outra história. E se no fim de tudo, sem explicações e pontos finais, nós acabassemos amigos? Acho que talvez seria até pior do que o afastamento bruto. Depois de toda aquela história que vivemos, de todo o amor que nos incendiou por tanto tempo, acabar como amigos é um tanto quanto triste, não acha? Nós ainda nos veriamos sempre, e toda aquela cumplicidade - que eu acreditava que se perderia - continuava ali. Mas você, como meu amigo, me pediria conselhos. E me apresentaria a sua nova paixão. Eu, pacientemente, e sem ter o que fazer, a conheceria. A acharia esquisita, e não merecedora de todo seu amor, mas de nada valeria meu palpite. E teria de suportar a dor de vê-lo em braços alheios, beijando bocas alheias, seu perfume espalhado por corpos alheios. E quem sabe, você me convidaria para ser a madrinha do seu casamento. É, seu casamento. Aquele que haviamos planejado um dia, e que agora, pertencia àquela fulaninha esquisita, e não a mim. E como eu, sua amiga, poderia dizer não? Faria todo o papel de boa amiga, e sorriria no altar, vendo o seu final feliz. Feliz, longe de mim.
Consegue entender o que me assustava, quando escrevi aquelas primeiras linhas? Sobre o meu medo de terminarmos assim, sem um final? Não estou dizendo que não quero ser sua amiga, não! Aliás, prefiro sim, sua amizade a nada. Mas, por deus, não aguentaria ser a sua melhor amiga, aquela a quem você confidenciará seus novos amores. Vou te propor uma coisa, então. Façamos um trato. Vamos nos sentar, e colocar um ponto final em toda nossa história? Não digo apagá-la. Só finalizá-la. Pedir desculpas por todas as besteiras ditas e feitas. Dizer o quanto nós nos lamentamos pelas mágoas e lágrimas ocasionadas. Somar as coisas boas, e guardá-las, para um dia, juntos, podermos recordá-las. Prometer nunca contar ao outro sobre novos amores, a não ser que um de nós encontre 'aquele' amor sabe? Aquele que é de verdade. Pegar as coisas ruins, juntos, e jogar fogo em tudo. Rir dos bons momentos. Nos abraçar e chorar uma última vez por tudo que passou. E uma última promessa, como casal, como cúmplices, como amigos. Prometer que nunca, nunca mesmo nada apagaria um de dentro do outro, e que aquela história poderia ser uma coisa boa, a ser contada depois de muitos anos para nossos netos e bisnetos, seja lá quem sejam nossos maridos e esposas. E então fim.
E ficaria tudo bem. E poderiamos ser amigos, enfim. Que tal? Pode ser assim?
Saudações,
Bá